terça-feira, 29 de maio de 2012

Criança desesperada!


'Ele não gosta dessa comida, então eu preparei um macarrão, senão, sei que não comeria nada', diz a mãe de um menino de seis anos. 'Já me disseram que faço tudo o que ela quer, que devo ter mais voz ativa', são as palavras da mãe de uma garota de quatro anos sobre a cena de birra diante da loja de brinquedos'. As crianças sentem muito quando o pai viaja; então, sempre que volta, traz tudo que elas pediram', é o comentário de outra mãe.

Até que ponto é importante satisfazer a vontade dos filhos?

Há um período inicial em que os pequenos devem ser atendidos quase que integralmente. Precisam dessa dedicação para que possam construir a confiança nos adultos, na sua própria capacidade de suportar frustrações e manter a esperança no futuro. Podemos, por exemplo, observar como os bebezinhos aguentam cada vez mais tempo, sem chorar, a espera por um adulto que os atenda. Eles adquirem tolerância e sem desespero confiam na satisfação que virá. Essa conquista se estende para a vida: esperar os pais na saída da escola, o doce preferido na sobremesa, o presente no dia do aniversário, a chegada dos amigos, os encontros com namorados. Também deverá haver tolerância para concluir a lição, prestar atenção nas aulas, enfrentar dificuldades no trabalho ...

O imediatismo faz parte  das relações  de vício e dependência. Quando a falta de algo é insuportável, a esperança desaparece do horizonte e tudo 'tem que ser já'.

Para criar esse recurso interno da tolerância e confiança no futuro, a criança precisa de uma alternância de duas situações: ser atendida  o suficiente para não se desesperar  e também ser frustrada para continuar buscando o que deseja. O desafio nessa jornada é a dosagem de cada uma dessas situações. Com intuição e sabedoria a dose será definida de maneira variável na interação particular de cada criança com sua família e educadores, naturalmente com muitas idas e vindas.

Nos nossos exemplos, os pais mostram diferenças e dúvidas. Não podemos saber se seus filhos receberam demais ou se foram submetidos a carências insuportáveis em determinado momento, pois ambos os casos  podem redundar em 'intolerância'.

É preciso cuidado quando, rapidamente, dizemos que 'os pais hoje em dia fazem tudo que seus filhos querem', como se a solução fosse frustrá-los.  Algumas crianças ou jovens realmente precisam de uma  atenção especial, mas esta deve ser para ajudá-los a ultrapassar, sem desespero, a angustia diante dos desejos não atendidos. Certamente, isso não se dará com pais e mães oferecendo comidas, brinquedos...

Helena Grinover e Marcia Arantes

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terça-feira, 22 de maio de 2012

Por que desmamar?






'Meu filho não quer largar o peito. Procura durante a noite, não sei o que fazer.'
'Tenho pena de desmamar, ele gosta tanto!' Já tentei mas não conseguí, fiquei com muita dó, ele ficava procurando abrir minha blusa, puxava...' 'O pediatra disse que já está na hora, mas não sei se concordo.'
Estas palavras ilustram o dilema que vivem as mães no momento de desmamar seus filhotes. Elas tendem a valorizar as perdas e o sofrimento, tanto para si como para o bebê. Parece que vai se perder o melhor do aconchego, do amor, da nutrição, da tranquilidade que só elas podem dar. Ainda não estão claros os ganhos importantes que virão...
Um recém nascido não percebe os limites de seu corpo e o confunde com o materno numa espécie de prolongamento da gestação. Pode, por exemplo, achar que o seio que o amamenta é uma parte dele. Aos poucos essa ilusão deverá se desfazer. A mãe, inícialmente muito envolvida com a fragilidade do pequenino, voltará a ter outras necessidades e prazeres que irão colocando uma distância entre eles. O bebê irá se dando conta desses  movimentos e, conjuntamente, desenvolverá a capacidade de suportar o fato de que não se encontra sempre conectado ao corpo de sua mãe.
Paralelamente, irá descobrindo objetos, sons, pessoas, partes do próprio corpo e, claro, outras comidas... O relacionamento entre mãe e filho se modifica: brincadeiras, palavras, oferta de alimentos. A criança aceita e gosta de alternar a presença materna com a de pessoas queridas. Surgem os dentes e ela já não necessita do leite para se manter.
A partir deste momento, o contato com o seio ficaria apenas a serviço do prazer e deve ser substituído por outras atividades. É comum as mães relatarem que a linguagem de seus filhos se desenvolveu bastante após o desmame. Resistir a isso é resistir ao crescimento.
O gesto da mãe, ao privar o filho do seio, o impulsiona para finalizar um movimento de apego e desapego, que  funcionará como modelo em períodos cruciais da vida. Ajuda-o a se constituir como um individuo  que não depende do corpo da mãe para se satisfazer.
Certamente, o aconchego, a intimidade, a ligação, virão de outras situações, onde o amor poderá se manifestar...

Marcia Arantes e Helena Grinover
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terça-feira, 15 de maio de 2012

Jogo eletrônico:distância ou proximidade?

























'Amanhã é domingo, meus pais deixam eu ir dormir mais tarde', diz o garoto de doze anos. 'Mas se for para ficar jogando essas "porcarias" é melhor descansar, acordar cedo e aproveitar o tempo com seus amigos', responde sua avó que tem pouco interesse por essas "modernidades"...

Podemos perceber como ela está distante do que é brincar para o seu neto...  O que os adultos propõe para que as crianças brincarem é uma manifestação da sua cultura. Quando as marcenarias eram responsáveis por boa parte da produção industrial, os brinquedos preferidos eram de madeira, hoje são eletrônicos. A visão que a sociedade tem do que seja educar, se divertir, ser criança, se expressa por meio do que ela concebe para o mundo infantil.  Entretanto, os pequenos também atuam nesse processo fazendo escolhas. Eles têm seus interesses; tanto é assim, que nem tudo que o lhes é oferecido faz sucesso.

Uma das funções do ato de brincar, é inserir a nova geração naquilo que a anterior lhe proporciona. Através dessa atividade a criança se apropria, ou seja, toma para si a produção cultural de maneira criativa. A partir da interação com o brinquedo, ela cria, fantasia, pensa, aprende e se sociabiliza.

Os adultos ficam defasados quando criticam as preferências infantis sem se darem ao trabalho de saber como são elaboradas as brincadeiras, o que têm de divertido, quais  são as satisfações que estão em jogo. Perdem espaço no relacionamento com os pequenos e a possibilidade de acompanhar o que eles estão construindo, como pessoas únicas que são, no tempo em que brincam. Afinal, é o que interessa.

Pais, avós e professores ganham na comunicação e diminuem a distância entre gerações quando não hostilizam, mas buscam conhecer o fascínio que os jogos eletrônicos exercem atualmente. Assim, podem participar do processo cultural e educacional de apropriação que cada criança faz desses brinquedos, introduzindo propostas alternativas, ampliando interesses. Sem essa proximidade, as palavras dos adultos correm o risco serem recebidas como vociferações sem sentido, 'blábláblás'...

Helena Grinover e Marcia Arantes
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terça-feira, 1 de maio de 2012

Mais sobre defesa

Um prezado leitor comentou nosso post 'Meu filho precisa se defender!' escrevendo o seguinte:  O tema é polêmico.  Criança que apanha continua apanhando ou dependente da decisão de outros quando for adulta?
A questão nos levou a considerar outros aspectos do assunto. O fato de uma criança estar frequentemente apanhando deve preocupar seus educadores. O mesmo pode ser dito a respeito das que costumam bater nos companheiros. É importante entender o que está acontecendo, uma vez que ambas estão trilhando caminhos perigosos... Sempre que uma ação se repete, causando sofrimento ou  prejuízo à criança, os adultos têm que intervir e ajudá-la a parar de repetir.
Aquela que apanha estará provocando, despertando a ira dos demais?  Estará sendo submetida por crianças maiores? Não consegue conversar e compartilhar, e isso a leva a invadir o espaço alheio?  A que bate insistentemente estará presenciando ou vivendo situações de agressão física ou outro tipo de violência? Será que sua linguagem é insuficiente e por isso parte para o ato? Faltam limites? Muitas vezes a mesma pergunta pode lançar luz sobre o que se passa dos dois lados do conflito. 
A ajuda dos adultos deve interromper a repetição e levar as crianças a encontrar uma atitude própria para sair desse lugar fixo, onde só se deparam com a dor de apanhar ou bater.
A pessoa que as auxilia nessa empreitada, na medida em que promove recursos para defesa, estimula a independência , de maneira que sua proteção pouco a pouco pode ser retirada. O objetivo final é colaborar para o desenvolvimento de  relacionamentos mais livres e equilibrados.
Tudo isso dá trabalho e os resultados  raramente são imediatos. Mas, é bom lembrar, trata-se de um percurso que começa em atitudes semeadas na primeira infância para terminar na existência de um adulto apto a exercer sua cidadania, conhecedor de seus direitos e deveres, menos propenso a aceitar ou cometer uma violência.

Helena Grinover e Marcia Arantes
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