domingo, 18 de dezembro de 2011

Boas Festas!

Cartão de Natal
João Cabral de Melo Neto

Pois que reinaugurando essa criança
pensam os homens
reinaugurar a sua vida
e começar novo caderno,
fresco como o pão do dia;
pois que nestes dias a aventura
parece em ponto de vôo, e parece
que vão enfim poder
explodir suas sementes:
que desta vez não perca esse caderno
sua atração núbil para o dente;
que o entusiasmo conserve vivas
suas molas,
e possa enfim o ferro
comer a ferrugem
o sim comer o não.


Desejamos a todos os nossos leitores Boas Festas e Feliz 2012 !
Estaremos de volta na 2ª semana de janeiro.
Até lá e grande abraço a todos!

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Dormir de porta fechada






















' Não sei o que fazer, minha filha vem toda noite para minha cama'. ' Às vezes a gente acorda e ela já está no meinho...' ' Fico com pena, ele tem medo à noite, e não quer ficar sozinho...' Variam as palavras, a classe social, o grau de instrução dos pais, mas essa questão se repete com frequência.
Quando colocam a situação os pais já sabem, de alguma forma, que ela não deveria ocorrer. Sentem-se pessoalmente incomodados, ou já ouviram falar que filhos não devem dormir com os pais, e consentir lhes dá certa culpa... 
A hora de dormir é, por essência, de relaxamento e intimidade. O momento propicia conversas e contatos corporais mais soltos. Será adequado para uma criança, com seu corpo infantil, estar presente? Ficar na cama dos pais, mesmo quando estão apenas dormindo, convida a criança a participar de uma intimidade da qual deve estar excluída. O contato com o corpo adulto nesta situação pode levar a percepções e sensações alheias ao universo infantil e, por esse motivo, violentas. Ao contrário do que se espera, a proximidade aumenta a angústia da criança, tornando-a insegura para outras oportunidades da vida como dormir em casa de amigos, viajar sem os pais, separar-se deles de alguma maneira.
Dá trabalho ajudar os pequeninos a permanecerem no seu espaço quando acordam perturbados. O adulto tem que sair do seu quentinho, ficar sonolento, decidir quem do casal executará a tarefa... Mas vale a pena acalmar a criança o quanto for necessário para que permaneça em sua cama. Haverá um enorme benefício, em vários aspectos, para todos os envolvidos . Os pais estarão mostrando ao filho os lugares de cada um na família, o que é muito importante para a construção de sua identidade. Este, por sua vez, se fortalecerá ao verificar que pode permanecer sozinho; além disso, será protegido de uma exposição nociva. 
O casal, por sua vez, ficará livre para as próprias vivências, encontros e desencontros que só a ele devem interessar. É bastante comum que a presença da criança sirva para os adultos aplacarem suas angústias, medos, solidão, sentimentos que normalmente assombram a todos, especialmente à noite. Seria interessante fazer uma reflexão a esse respeito, pois corre-se o risco de inverter os papéis, sobrecarregando a criança com o sofrimento dos mais velhos.
Há muitas ocasiões para compartilhar o prazer de estar junto. Mas na hora de dormir, o melhor é fechar a porta!
Marcia Arantes e Helena Grinover
Caso seu filho apresente dificuldade persistente, marque um horário para conversar























sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Por que presenteamos?




Tereza tem um irmão um ano mais velho. Certo dia, por volta dos três anos e meio de idade, ela se aproxima da mãe e pede: 'Mãe, você me compra um pipi?' Bastante atrapalhada, como podemos imaginar, a mãe lhe dá uma resposta ponderada, educativa: 'filha, você é uma menina e são os meninos que têm pipi, meninas são diferentes'. Ao que a garota retruca: 'tudo bem, pode me dar um cor de rosa'.
Na idade de Tereza, as crianças ficam atentas a essas diferenças de gênero baseadas na percepção visual do que eles têm e a elas falta. A partir desse momento, os presentes podem adquirir um novo significado que o pedido ilustra claramente: a vontade de receber o que aparentemente está faltando, com a ilusão de que se o possuísse a vida seria maravilhosa. A força desse desejo é tal que a garotinha não leva em conta as dificuldades da realidade e resolve a questão com a ideia criativa de um pipi cor de rosa. A mãe, nessa história, é vista como quem tem o enorme poder de tornar real a façanha, o que seria absolutamente mágico!
Receber o presente muito desejado proporciona por instantes a falsa sensação de felicidade completa. Por outro lado, dar o presente produz também um prazer de caráter ilusório na pessoa que está presenteando, o poder de realizar essa felicidade no outro... Ambos vivem o que Tereza propõe à sua mãe, um delicioso momento mágico!
Entretanto, vale lembrar que os pais são modelos para seus filhos, e a premência em atender a todos os pedidos, termina por transmitir a ideia de que é insuportável não ter tudo que se quer.
Ao contrário, o sentimento de falta abre a possibilidade de outros prazeres, muda a maneira de se satisfazer. Mostrar tranquilidade em relação a isso pode ser bastante educativo.
Os adultos podem evitar as correrias deflagradas pelas listas de Natal, que transformam as pessoas em um 'Papai Noel atarantado' percorrendo os shoppings, oferecendo presentes 'surpresa' ou até deixando algo a desejar...

Helena Grinover e Marcia Arantes
























































































































































sexta-feira, 25 de novembro de 2011

E se eu não passar?


















Os alunos do último ano do ensino fundamental estão dando uma festa, comemoram conquistas e se despedem! No próximo ano vão todos mudar de escola para cursar o ensino médio. Alguns sentados numa rodinha comentam os exames de seleção que enfrentaram. De repente, um garoto começa a chorar, não conseguiu entrar naquela escola que é a 'melhor' e seu irmão gêmeo sim. Que decepção! Mas, além disso, ele tem a idéia de que o irmão 'tá feito'.

Qual é a melhor escola? Muitos critérios são levantados, desde metodologia de ensino, valores humanos, instalações físicas, até aspectos práticos como distância, preço, vagas. Numa sociedade competitiva como a nossa, é fatal que entrem em jogo critérios como a posição da escola no 'ranking' do ENEM ou as estatísticas que quantificam a porcentagem de aprovados nos vestibulares.

Aparentemente, quem está dentro de uma das primeiras do ranking já é primeiro em alguma coisa. Não é bem assim, uma escola pode ser muito adequada para determinado estilo de aluno e ser inadequada para outro. Os melhores resultados advirão do bom encontro entre aluno e escola, com o reconhecimento feito pela família.

Assim como os concursos que escolhem 'o melhor jogador ou a melhor atriz ' levam a uma ilusão fantasiosa, pois não existe 'o melhor' e sim o primeiro em determinadas seleções, também nos iludimos quando acreditamos na 'melhor escola'. Os vencedores de concursos são talentosos e preparados para alguns aspectos da vida, mas certamente despreparados e mal dotados para outros, do mesmo modo que as escolas!

Quando falamos que alguém é campeão, é o primeiro, esquecemos que somos todos incompletos, 'ninguém tá feito', em idade alguma. Experimentar e assimilar essa 'prova' de não ser aprovado constitui uma das lições para o futuro. O sucesso em qualquer atividade está quase sempre vinculado a não se deixar abater pelos fracassos.

Crianças e adolescentes perdem de vista a perspectiva, sobretudo no momento de vestibulares e seleções, de que a educação formal é um processo, e que há uma diversidade de caminhos possíveis. Passar no exame é um marco importante, sem dúvida, mas não deve ser entendido como a obtenção de um selo de garantia da qualidade. Há mais mistérios sob o céu e a terra...


* Aos interessados pela diversidade na formação escolar, indicamos o excelente artigo de João Batista Araujo de Oliveira, "Dilema no ensino médio", publicado no Jornal Folha de São Paulo em 29/11/11.

Helena Grinover e Marcia Arantes
Caso seu filho apresente uma dificuldade persistente, marque um horário para conversar.
http://vivazpsicologia.blogspot.com.br/p/servicos_22.html


domingo, 20 de novembro de 2011

É hora de comer !


















Observo a cena de longe, sem ouvir as palavras: em uma mesa estão sentados quatro adultos e na cabeceira uma menininha de seus 15 meses. A criança tenta com um garfo pegar algo do prato de seu pai. Ele afasta o prato, tira dela o talher e lhe oferece com as próprias mãos uma colherada; ela vira o rosto. Agora a garota se estica por cima da mesa, pega outro garfo e tenta comer do prato de sua mãe. Novamente não deixam. Já quase deitada sobre a mesa a menininha abocanha um alimento com a mão. Outra vez afastam os pratos e um adulto procura lhe dar comida diretamente na boca. Inútil, ela não quer. Numa pequena distração dos grandes, pega outro garfo, consegue espetar a comida e põe na boca. No mesmo instante a mãe exclama: 'Olha! Não sabia que já conseguia comer com o garfo'.
A garota estava muito interessada em usar o garfo para comer, revelando uma capacidade de independência desconhecida por seus pais.
Os adultos fazem verdadeiros malabarismos para conseguir que os pequenos comam, o que pode despertar neles maior interesse pelas brincadeiras do que pela atividade de se alimentar. Quando o ato de comer ocorre sempre junto com o de brincar, assistir televisão e outras artimanhas, criam-se verdadeiras dependências. Frases do tipo: "ele só come se..." ilustram bem isso. Portanto, nada de brinquedos, livros, musiquinhas que distraiam e façam com que a criança não perceba que está ingerindo. Sentir o alimento na boca, a mastigação, a deglutição, faz com que o ato seja prazeroso em si mesmo. Os recursos adicionais enganam, trazem mais dificuldades do que alívio.
Deixar que os pequenos comecem a comer sozinhos não é nada fácil. Há o receio de que não comam o suficiente, o trabalho de limpar roupas e objetos , o processo é mais lento... Entretanto, desta maneira eles podem constituir o desejo de se alimentar e responsabilizar-se por ele. Podem seguir o próprio ritmo, estabelecer a quantidade, desenvolver um interesse pela atividade motora de apanhar o alimento e levá-lo à boca.
É muito importante apostar na capacidade da criança de gostar do ato de comer. Se, por vezes, ela não se alimenta na quantidade esperada, que isso possa ser aceito como uma alteração que faz parte do processo. As quantidades variam em função da idade e do momento, sem causar abalo na nutrição. O acompanhamento do pediatra ajuda os adultos a terem uma referência para indicar se o desenvolvimento da criança está adequado.
Que tal dar adeus ao famoso aviãozinho ?






sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Essa menininha sabe o que quer!




















Meses de ensaio e preparação - a apresentação de final de ano na escola, como sempre, é um momento especial. Crianças agitadas, pais e professores ansiosos, fantasias, adereços, tudo pronto. Avós e tios avisados, câmeras fotográficas a postos! Na hora 'H' a menininha não quer se apresentar. Esconde-se na saia da mãe, foge, chora .
Frustração geral; frequentemente a sensação é de fracasso para os pais, educadores e, principalmente, para a criança.
Em relação a essas apresentações criou-se uma 'verdade': se a criança está bem do ponto de vista emocional, desempenhará o papel esperado. Será mesmo?
A disposição para se apresentar em público depende de vários fatores que são inacessíveis aos observadores: só a criança tem condições de escolher se quer ou não quer. Não há uma idade adequada para o desejo de participar de competições, acampamentos, etc.
A possibilidade de dizer 'não quero' é preciosa, garante a preservação da integridade interna e portanto deve ser respeitada. É alentador saber que a própria criança é capaz de colocar seu limite. Ao aceitar a recusa os educadores não deveriam ficar decepcionados, mas tranquilos por saber que não estão cometendo uma violência contra os sentimentos infantis.
Às vezes, a quantidade de 'holofotes' torna esses momentos excessivamente especiais e dificulta a vida de todos. Supervalorizar a atitude da criança que se apresenta ou a da que não se apresenta só aumenta esse efeito 'holofote'. Vale lembrar, trata-se 'apenas' de uma apresentação.
Na educação uma das grandes metas é aprender a reconhecer os próprios limites e a dizer 'não' sem precisar atender a todas as expectativas. Os pais de um adolescente certamente se sentirão mais seguros sabendo que o filho tem essa capacidade...
Se os familiares e a escola puderem aceitar com tranquilidade aquela criança que disse 'não", as chances de que ela se apresente na próxima ocasião serão maiores!

Marcia Arantes e Helena Grinover
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sábado, 5 de novembro de 2011

Beleza de trânsito






















Mãe e filha de nove anos estão presas no trânsito, ainda levarão 40 minutos para chegar. De repente a mãe comenta: olha, a placa desse caminhão é FFF! A menina fala três vezes um palavrão que começa com a letra F. A mãe diz: Feio, Feio, Feio... A garota faz outra sequência de três palavras começadas com F.
Passam a brincar com as placas dos outros carros. Cada vez uma delas cria a sequência, as palavras começam a formar sentenças e até rimas. As duas não se dão conta do tempo e chegam ao destino. A menina desce do carro, se despede e diz: pegamos trânsito mas foi bom! A mãe pensa: é verdade...
Em tempos de metrópoles congestionadas, onde os adultos trabalham muito e têm vida corrida, as oportunidades de brincar com as crianças podem ser preciosas. Nesse dia, sem perceber, mãe e filha puderam transformar a situação. O que teria sido um adulto queixoso e uma criança entediada, foi um tempo de diversão criativa. Essa menina foi poupada de ouvir as lamentações adultas, que são sempre muito desanimadoras para os pequenos.
Muito já se falou sobre a diferença entre qualidade e quantidade do tempo que os familiares têm para ficar com as crianças . O tempo é de qualidade quando propicia intimidade, espontaneidade, cria laços de confiança. Nesses momentos se transmitem valores, histórias familiares, confidências ... Às vezes, é suficiente mudar a qualidade e não aumentar a quantidade.
Parece-nos interessante inventar formas de cuidar brincando para aproveitar o tempo. Para cada idade há brincadeiras que podem ser feitas enquanto se toca a vida cotidiana. No exemplo acima, surgiu um jogo em torno do material que estava diponivel nas ruas da cidade, as letras das placas. Este é um aspecto importante a realçar: as crianças gostam de brincadeiras e não necessariamente de brinquedos. Além disso, a mãe não ficou na posição de apenas criticar os palavrões, mas aproveitou a ideia para chamar a atenção sobre "palavras feias".
Aos adultos cabe o desafio de serem criativos, o que também é muito divertido!

Helena Grinover e Marcia Arantes
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domingo, 30 de outubro de 2011

Mentiras


'Meu filho mentiu para mim! Ele escondeu o boletim, disse que a escola não tinha mandado.' 'Minha filha disse que fez a lição, quando fui ver, não tinha feito!' ' Ele disse que foi para a casa do amigo estudar e não foi '.
Os pais querem acreditar que podem sempre confiar nos filhos. A constatação de que não é assim, abala profundamente a certeza de que conhecem esse ser tão próximo. Percebem, decepcionados, que não podem ter o controle que esperavam. Pergunta inevitável: e agora, o que fazer? Ou ainda: porque ele fez isso?
A criança, até aproximadamente seis anos, não sabe o que é mentir. Ainda não sabe que seus pensamentos são secretos, que ninguém pode vê-los, e menos ainda que suas palavras podem ocultar o que está pensando. Trata-se de uma conquista do seu desenvolvimento perceber que pode esconder o que sabe. Isso é concomitante a ter privacidade, ter pensamentos não compartilhados, adquirir alguma liberdade. A mentira é ainda mais complexa. Quem mente manipula a expectativa do outro, regula o que vai dizer de acordo com o que imagina ser o desejo do ouvinte. O prazer dessa descoberta pode levar a criança pequena a mentir, numa espécie de 'brincadeira' para escapar da soberania do adulto.
Quando ocorrem mentiras como nos exemplos acima, nas idades em que se espera que haja responsabilidade com as tarefas escolares e com os acordos familiares, são um sinal para refletir. Será que há falta de privacidade ou de liberdade, um excesso de controle dos pais? Ou ainda, a criança está evitando críticas, ameaças, punições e no momento de enfrentar a dura verdade das notas baixas na escola, das lições sem fazer, os adultos não são vistos como colaboradores? A mentira que supostamente protegeria a criança não está ocorrendo para evitar dissabores aos adultos, não é uma maneira de preservá-los?
Há motivos e intensidades diferentes nestas situações; cabe aos educadores a difícil tarefa de avaliar e de não mentir para si mesmos ao lidar com tudo isso. Conversar com franqueza é uma iniciativa interessante.
Pode ser um bom momento para rever expectativas e flexibilizá-las.


Helena e Marcia Arantes
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domingo, 16 de outubro de 2011

Perguntas difíceis
















'Mamãe, Deus existe?' 'O que você acha, filha?' 'Acho que não, porque quando viajei de avião não vi nada lá no céu, só nuvens. E todo mundo diz que ele fala com a gente, mas eu também nunca escutei.' A bisavó, que é bastante religiosa e presenciava esse diálogo da menininha de 6 anos com sua mãe, acrescentou:'Mas Deus fala ao nosso coração'. 'Bisa, coração não é ouvido, né?!' Nesse momento, chegaram ao local de destino e, para alívio da mãe, a conversa se dispersou.
A criança faz muitas perguntas difíceis. Porque o bichinho morre, para onde ele vai depois, os pais vão morrer, ela vai morrer?...Observa tudo: quem beija na boca, quem fica pelado na frente de quem... 
Nessa idade, ela já tem recursos de pensamento que permitem considerações, como as da conversa acima. Está separando a fantasia da realidade, buscando o que pode ser comprovado, vai se tornando um verdadeiro cientista! Ela sabe, por exemplo, que o bebê antes de nascer está na barriga da mãe, pode ter ouvido estórias sobre a sementinha que o papai fornece, mas por mais que se esforce, ainda não consegue entender o que leva o papai e a mamãe a desejar um bebê, ou o que há de prazer nisso. Só mais tarde, com as mudanças corporais da adolescência, poderá alcançar outras formulações. Entretanto, cria hipóteses, desenvolve 'teorias', exercita o desejo de conhecer.
As perguntas, embaraçosas e incômodas, colocam os adultos diante de suas próprias incertezas. Esses pequenos pesquisadores percebem que os mais velhos também não estão tão seguros de suas "verdades", mas precisam do seu apoio e atenção para continuar as pesquisas. O processo da aprendizagem brota dessa curiosidade insistente e enérgica das crianças.
Às vezes, respostas conclusivas ou muito explicativas atrapalham o caminho, bloqueiam o processo no lugar de estimulá-lo, e podem até ser perniciosas se trouxerem conteúdos fora das possibilidades de conhecimento da criança naquele momento.

Marcia Arantes e Helena Grinover
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sábado, 8 de outubro de 2011

O objeto amado do bebê

















Cecí, bebê de um ano e dez meses de idade, tinha como seu objeto mais amado uma bonequinha de pano chamada pela família de 'naná'. Ela sempre o acariciava enquanto chupava o dedo. Assim pegava no sono, se acalmava , se distraía... Todas as vezes que saiam de casa a mãe de Cecí se preocupava em colocar na bolsa o 'naná'. Um dia a avó a levou para passear e não se lembraram do precioso objeto. A certa altura, a garota pediu seu 'naná', a avó explicou que havia ficado em casa e que mais tarde ela o encontraria lá. Num primeiro momento Cecí chorou, depois foi se conformando e começou a cantarolar um 'nana nenê' que foi se transformando em nana naná, naná naná, de maneira a compor uma nova musiquinha.
O episódio nos pareceu útil para ilustrar como essa 'falha' na atenção da mãe, que se esqueceu de colocar o naná na sacola de passeio, pode ser aproveitada pela criança. Esta escutou a avó e entendeu que apenas mais tarde teria o brinquedo desejado. Mas manteve a presença da boneca na medida em que ia falando seu nome: naná, naná... Assim, substituiu o objeto pela palavra, caminhando na aquisição da linguagem. Outra transformação importante foi substituir o prazer de chupar o dedo pelo de cantar, o que abriu a possibilidade de compor uma música! Na falta de um tranquilizante, ela criou outro.
Ao longo dos primeiros anos de vida, o bebê enfrenta várias substituições. Terá que se separar do seio, da mamadeira, da fralda, da presença contínua da mãe... É frequente que os adultos associem esses momentos com o sentimento de tristeza, insegurança, pesar. Muito temos a prender com a Cecí nesse episódio. Ela conseguiu parar de chorar sem esgotar suas energias, passou da tristeza para o canto, parou de pedir insistentemente, dirigiu sua atenção a outra atividade e foi criativa. Isso tudo indica que, não apenas suportou o sofrimento, mas cresceu com ele. É bom que se diga também que esta não foi a despedida definitiva. É interessante que as próprias crianças possam ir deixando o seus nanás.
As separações que a criança vive nesse primeiro momento da vida, devem ser vistas como abertura para outros interesses e novos relacionamentos. São necessárias para o crescimento, para a inserção social.
Cabe aos educadores dosar essas passagens, propondo-as gradualmente, de modo que a criança possa encontrar recursos internos para se ajustar às novidades. E cabe a eles também olhar para ela com a confiança de quem já vê à frente as conquistas que advirão dessas aparentes 'perdas'.

Helena Grinover e Marcia Arantes
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segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Atenção!




















'Presta atenção, menino!' 'Concentre-se!' 'Você é muito distraído, não para quieto!' 'Que agitação é essa?!' Todas as crianças escutam algo desse tipo em algum momento, mas algumas escutam mais do que outras.
Nossa atenção pode ser desviada por motivos diversos. O primeiro e mais básico de todos é que o mundo está cheio de estímulos. O bebezinho recém-nascido mostra muito bem isso, ele olha para tudo, indistintamente. Aos poucos vai destacando nesse mundo infinito alguns aspectos nos quais se detém mais, os olhos da mãe, uma cor intensa, um movimento, um som...Ele começa a 'prestar atenção', ou seja, começa a recortar alguns estímulos. A mãe vai acoplando frases a esses recortes: 'Você está olhando prá mamãe', 'Olha o palhacinho!' Vai atribuindo significado a seus movimentos e assim possibilita a criança desenvolver interesses e criar vínculos.
Os interesses ficam abalados na situações de dor, cansaço, falta de atividade física, ansiedade, insegurança...enfim, uma quantidade de condições vitais produz esse efeito. As crianças estão sujeitas a essas alterações mais que os adultos, pois ainda estão desenvolvendo a capacidade de disciplina e contenção que algumas atividades exigem. Quando uma criança altera demais seu padrão de comportamento, uma cuidadosa investigação precisa ser feita, envolvendo vários profissionais, o orientador educacional, o médico, o psicólogo.
Há alguns anos vivemos uma espécie de moda de acreditar que toda alteração de atenção e ou hiperatividade deve-se a um TDAH (transtorno de déficit de atenção com hiperatividade) que seria, segundo pesquisas médicas indicam, decorrente de uma alteração no metabolismo neural.
À luz de outras abordagens, a falta de atenção é um fenômeno que deve ganhar significado individualizado. Supõe-se que seja a expressão de anseios, preocupações, conflitos, dores psíquicas. Para tratar esse sofrimento é necessário ouvir a criança, levá-la a decifrar para si mesma o que a falta de atenção diz a respeito de sua vida. Ainda que se comprove um quadro neurológico a ser medicado, é importante entender os significados que a criança atribui a essa disfunção e aos efeitos causados por ela em sua existência.
A medicação não deve ser usada para calar o sofrimento psíquico, sob pena de ensinarmos aos mais jovens que as substâncias químicas podem eliminar, magicamente, a dor que nossa relação com os semelhantes e com mundo nos causa. O diagnóstico desse transtorno é delicado e todo o cuidado é bem-vindo para não retirar da criança a preciosa oportunidade de aprender a se controlar, de descobrir interesses que prendam sua atenção, de desvendar sentimentos e desejos que a perturbam.
Por isso, educadores que lidam com crianças que estejam mais agitadas ou desatentas, não se distraiam com conclusões apressadas, atenção!!!

Marcia Arantes e Helena Grinover
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sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Quem é o bebê?



O pai de um garotinho de cinco meses viaja frequentemente devido a compromissos profissionais e, por ocasião de cada ausência, conversa com seu filhinho. Com a voz tranquila e séria diz coisas assim: 'preste atenção filho, vou viajar e você vai ficar com sua mãe. Comporte-se bem, tá? Volto daqui a quatro dias. Vou sentir saudades'.
Ao falarmos com os bebês mesmo sem sabermos o que eles podem entender de tudo que é dito, produzimos uma série de efeitos. É por meio da nossa fala que são incluídos no universo dos seres que têm uma linguagem. Oferecemos as nossas palavras como que dizendo: você é um de nós. Isso muda radicalmente suas vidas!
Quando o pai se dirige ao bebê do nosso exemplo, é como se estivesse diante do filho que ele sonha ter daqui a algum tempo. Enquanto antecipa a visão de um individuo falante, determina um lugar para o novo ser. Embora nesse momento o garotinho ainda não compreenda os significados específicos que o pai lhe transmite, ele já tem um lugar que seus familiares lhe reservam e que sabem que em breve será ocupado. O pai expressa nessa fala, provavelmente sem se dar conta, o seu desejo e expectativa em relação ao filho. É como se ele dissesse: 'Filho, desejo ser muito importante para você e espero que sinta minha falta da mesma forma que sentirei a sua.'
Sempre que alguém se dirige ao bebê olhando-o como uma pessoa que ele próprio ainda não é, antevê o espaço que virá a ocupar e assim lhe dá condições de vir a ser de fato 'uma' pessoa.
As falas endereçadas ao pequeno são, geralmente, tentativas de decifrar e traduzir em palavras os sinais sonoros, o olhar, as mudanças no rostinho. Vão dizendo se está com raiva, feliz, com sono, vão contando uma história sobre seus dias, lhe apresentam o mundo. Envia-se assim uma série de imagens e palavras necessárias para que vá constituindo uma idéia de si e dos outros. É o começo de um processo que o acompanhará vida a fora, 'quem eu sou e quem são os outros'.
Essas 'conversinhas' que os cuidadores fazem intuitivamente tão bem quando estão amamentando, trocando, banhando... são tão importantes! Elas oferecem ao bebê uma rede de proteção que dá sentido ao mundo.

Helena Grinover e Marcia Arantes
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quarta-feira, 14 de setembro de 2011

A menininha vira fera


'Mãe, quem mandou você fazer isso? Você sabe que eu não gosto!' 'Não vou prá aula hoje! Já falei!' 'Quem mandou você mexer na minha boneca?' 'Tira isso daqui!' Não quero ouvir essa música, para de cantar!!!' 'Não vou dormir agora, já falei que não vou!'
A menininha aos 6 ou 7 anos, tão engraçadinha até então, vira uma pequena tirana. Dá ordens à vontade, enfrenta os adultos com a maior naturalidade, manda e desmanda na casa. Os adultos às vezes riem, outras se constrangem, outras ainda se enfurecem. Como lidar com a situação na qual, até os pais mais controlados, sentem-se impelidos a usar de força, como se estivessem num 'braço de ferro' com a filha
Ao lado disso, outras mudanças estão ocorrendo: a distinção entre realidade e fantasia se fortalece, a menininha já sabe que algumas estórias são inventadas e outras são de verdade; os dentes de leite começam a cair e com eles a carinha de bebê; as exigências escolares aumentam e as expectativas em relação ao comportamento também.
Grande batalha enfrenta essa menina! Suas crenças estão abaladas, até seus dentes estão abalados! A visão que tem sobre seus pais também está em mudança. Eles diminuem de tamanho e ela cresce, já começa a vislumbrar que um dia estarão do mesmo tamanho.
Essa descoberta encorajadora, é também o abalo da proteção inquestionável que os pais representam durante os primeiros seis anos de vida.
Ela já tem quase certeza de que a vida não é um conto de fadas, está perdendo a ilusão da força das varinhas mágicas e ao mesmo tempo ainda não é uma mulher como sua mãe, sua professora. Como conseguir então ser alguém importante, como realizar seus desejos, como ter controle sobre esse mundo que se apresenta complicado e inatingível?
O que aparece como malcriação pode ser visto como tentativa um pouco desesperada de se sobrepor, de recuperar o poder representado pelas 'Cinderelas' que magicamente vencem todas as dificuldades e tornam-se 'felizes para sempre' com seus príncipes e vassalos...Se isso agora não pode mais ser conseguido com varinhas ou beijos de amor, quem sabe se na 'base do grito' a coisa funciona?
Mais do que ser enfrentada, a menininha precisa ser ajudada a encontrar maneiras de se relacionar sem ocupar o lugar de 'sua majestade', tampouco o de 'seu vassalo'.

Marcia e Helena Grinover
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sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Irmãos só mudam de endereço...

























Quem tem filhos que já passaram da primeira infância conhece bem essas palavras: Saia daqui ! Seu chato! Cala a boca! Quem mandou você pegar? Idiota! Você vai ver! E daí por diante... São brigas sem fim, por espaço no sofá, pelo uso do quarto, por roupas, por objetos, por ofensas que um dirige ao outro...
Os pais ficam desgostosos e pensam que os filhos deveriam ser mais unidos. Mas é justamente essa a questão: irmãos com idades mais próximas, ou que ficaram mais juntos nos primeiros anos, tendem a brigar mais. Estão, de certa maneira, próximos demais !!!
Se no início eles compartilham amor, atenção, cuidados e disputam o espaço junto aos pais, na medida em que o tempo passa, é necessário que cada um marque um espaço próprio, e cuide para que as fronteiras não se apaguem. Quando entram na puberdade, precisam defender cada centímetro do que é seu. É compreensível se pensarmos que nessas idades o que está em jogo na vida é a definição da nova identidade, que se constrói também pela apropriação do espaço e dos objetos.
A sexualidade se intensifica, trazendo anseios e perigos para quem precisa dominá-la. Por isso, os contatos corporais adquirem novas características, bem diferentes daquelas da infância. Muitos deixam de ser carinhosos como eram, evitam até de se tocar.
Lembremos que a briga, agora muito mais verbal, é uma maneira de se definir diante do parceiro e ficar 'independente'. Nesse sentido ter irmãos é uma oportunidade para esse exercício, e eles sofrem uma espécie de atração por essa atividade. É comum ouvirmos os pais dizerem: ' deixa seu irmão, ou sua irmã em paz', pois percebem que os filhos estão sempre fazendo uma provocação, chamando para mais uma contenda
É interessante que os adultos fiquem vigilantes para intervir se for necessário protegê-los. Porém, é bom deixar que os irmãos resolvam suas questões e isso vale para os pequenos também. Com as brigas aprendem muito, inventam regras, regulam a agressividade, avaliam a força que têm, descobrem as conseqüências do que fazem, perdem a parceria, negociam a paz. Sim, porque irmãos são parceiros tanto para se divertir, ter cumplicidade, quanto para brigar e enfrentar problemas.
Os adultos podem ajudá-los reconhecendo as individualidades, favorecendo a percepção de que se há diferença, há espaço para todos.

Marcia Arantes e Helena Grinover
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segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Promessa é dívida




















'Hoje não posso ficar com você , mas prometo que fico no fim de semana'; 'agora tenho uma reunião, mas prometo andar de bicicleta amanhã'.
As relações entre pais e filhos são repletas de promessas... Geralmente aparecem no momento em que os pais se dão conta de alguma carência no filho, e sentem-se devedores. As promessas projetam a dívida atual para o futuro, e buscam transformar a culpa numa certeza de reparação. 
No dia a dia, muitas variáveis interferem para nos desviar do que pretendemos fazer. O trânsito, a reunião que se estendeu mais do que devia, o dinheiro que não sobrou como se planejava, falta paciência para não agir daquela forma agressiva . 
A decepção é grande quando uma promessa não se cumpre, especialmente para crianças na primeira infância, quando a crença na infalibilidade dos pais é necessária. 
Por outro lado, sabemos que faltar com a palavra é humano e as crianças com o passar do tempo descobrem que os pais falham. Descoberta, aliás, muito importante porque também as liberta, podem ser imperfeitas. Passar a vida acreditando em seres infalíveis é fonte de muito sofrimento e inúmeras decepções .
Na verdade, quando fazemos uma promessa estamos dizendo que 'temos a firme intenção', ou 'um grande desejo' de realizar aquilo. Podemos ter no máximo a certeza dessa intenção, mas não temos a certeza da concretização.
Talvez o mais importante para a criança seja perceber que seus pais se sentem tranquilos fazendo o que lhes é possível - as limitações são muitas - para que ela tenha uma vida boa!
O sentimento dos pais de que estão em falta com os filhos pode ser um bom começo para um processo de mudança, com a abertura de novas idéias sobre a interação familiar.

Marcia Arantes e Helena Grinover
Caso vivencie um sofrimento persistente, marque um horário para conversar.







quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Crianças na rua da amargura























Os jornais têm noticiado nos últimos dias a situação de crianças com idades entre 9 e 15 anos que perambulam por ruas de São Paulo, formam grupos que roubam ou praticam pequenos assaltos.
Sabemos que essas notícias são apenas um fragmento revelador da imensa fratura exposta da nossa sociedade quando se considera a estrutura de cuidados com as crianças.
Chamou nossa atenção, no entanto, uma informação da Folha de São Paulo no dia 28/08/2011: as meninas roubaram cremes para alisar cabelo e lentes de contato verdes para mudar a cor dos olhos. Declararam que querem ficar bonitas, se acham feias e desejam o que as 'loirinhas' têm, como celulares e outros ícones de consumo, de preferência com a cor rosa.
Revelam, dessa maneira, um desejo de mudança, querem se transformar e talvez viver em um mundo mais cor de rosa. Infelizmente, estão erradas quanto aos métodos utilizados para 'virar outra pessoa'. Além disso, estão muito longe de seus ideais, importados de países ricos onde a população é, predominantemente, loura de cabelos lisos e olhos claros.
Mas o que nos interessa aqui é marcar o desejo de mudança dessas meninas. O desejo é uma força psíquica poderosa que pode ajudá-las a sair dessa rota de choque com as instituições e as leis, para trilhar um caminho de construção dentro da realidade.
Essas pobres abandonadas terão uma brecha de salvação se, antes de as rotularmos de 'ladras' ou 'delinquentes', levarmos em conta que enxergam um ideal para si mesmas, o que é fundamental para construir um projeto de vida. É necessário escutá-las.
Quando o educador valoriza as ambições e desejos expressos por crianças e adolescentes, sobretudo quando provenientes de grupos cujas carências sociais são enormes, pode ajudá-los. Trata-se de transformar esses ideais que, num primeiro momento, são fantasiosos, ousados demais, fora da realidade, em projetos factíveis. Nesse processo os futuros cidadãos irão desenvolver escolhas, descobrir aptidões, e a imagem que têm de si mesmos ficará modificada.
Haverá aí uma chance daquelas meninas se sentirem bonitas, sem precisar de olhos verdes roubados.

Helena Grinover e Marcia Arantes
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terça-feira, 23 de agosto de 2011

Castigo para que?




Temos visto em muitas famílias, de todas as classes sociais, uma profusão de castigos impostos aos filhos, na tentativa de resolver situações. Não ir bem na escola, não fazer as lições, brigar com o irmão, não comer adequadamente, desrespeitar adultos, falar palavrões... têm sido motivos para punições. Parece que se configurou uma 'moda' na educação e na hora do desespero dos pais, aliás muito compreensível, o castigo aparece como solução, mas vale a pena refletir sobre isso.
Qual o pressuposto do castigo? Ele priva a criança de algo que ela gosta em decorrência de um comportamento indesejado, mas, quase sempre, não está relacionado com o que o motivou. Eis um exemplo: xingou a mãe, não vê televisão. Para que serve? De que maneira isso ensina a criança a buscar uma solução mais eficiente para as diferenças entre ela e sua mãe, ou para expressão dos seus sentimentos, sem xingar e desrespeitar? Outro, muito usado: não estudou para a prova, fica sem ir à casa dos amigos por um mês. Como isso ajuda a superar dificuldades de se organizar, ter interesse pelos estudos, etc?
Ocorre, frequentemente, que as situações se repetem, e o relacionamento entre pais e filhos transforma-se num braço de ferro, numa competição no estilo 'vamos ver quem tem mais força'. Quando a educação se converte preponderantemente num jogo de dominação, é sinal de que algo está fora do lugar. O que se espera como resultado num jogo desse tipo? Como isso colabora para o aprendizado da resolução de conflitos sem agressões inaceitáveis? Como colabora para vencer as dificuldades da vida? Seria interessante que os pais tentassem responder a essas perguntas antes de decidir como interferir. Educar não é dominar, ao contrário, deveria ser ajudar a se controlar, a desenvolver recursos para resolver os problemas.
A 'moda' do castigo desconhece os motivos individuais que cada criança tem para agir e iguala todas elas propondo essa estratégia: causar um sofrimento para extinguir um comportamento indesejado. Quando a situação se repete seria melhor ajudar criança a falar sobre o que está fazendo e buscar uma mudança. Muitas vezes é possível pedir a ela que repare o que estragou, nas relações ou na sua própria vida, não como castigo, mas para que participe construindo.
Afinal, esse talvez seja um dos principais objetivos da educação: ajudar a construir.

Marcia Arantes e Helena Grinover

terça-feira, 16 de agosto de 2011

Dito e feito


















O pai chega em casa à noite e... surpresa!! O filhinho querido, no auge do poderio dos seus 3 anos de idade, havia feito vários desenhos na parede recém pintada da sala. E agora? O que fazer? Reação imediata: dar uma bronca, já tinham combinado que não podia fazer isso. Castigo? Sentimentos díspares invadem o pai, provavelmente cansado do trabalho. Ele gastou um bom dinheiro para pintar as paredes, mas afinal o filhote colocou ali suas produções mais caprichadas, que merecem todo o respeito, vai ver quis agradar...ou quem sabe, está bravo porque ficou muito só durante o dia, não estão lhe dando a atenção devida, enfim, muitas hipóteses...Por vezes, muitos pensamentos desviam o educador da necessidade de preservar o limite.
Aos três anos de idade a palavra dos pais ainda não tem muito poder para coibir a ação da criança, especialmente se não estiverem presentes no momento do ocorrido . Mas temos visto crianças mais velhas demonstrando também quão pouco essas palavras têm poder sobre elas. Os pais se queixam da falta de efeito do que dizem: é desgastante, cansativo.
O que fazer? O que o pai desse garotinho pode fazer para que no futuro não venha a se deparar com a mesma questão? Sua palavra precisa ser ancorada no respeito pelo que é dito, ou seja, o que é falado precisa ser efetivado e cumprido dos dois lados, do pai e do filho. A dose de rigor a ser aplicada em cada idade e em cada situação é diferente. 
Combinar com a criança uma meta que nem ela nem o adulto conseguirão cumprir fragiliza o processo de construção do valor da palavra, por isso é importante que os pais dosem as exigências. Fica difícil quando os filhos começam a pensar: Ah... meu pai fala, mas depois...
No caso do garoto 'pintor' o pai deveria solicitar a participação do filho para limpar a parede, deixando-a na cor que estava. Mesmo que o resultado não seja igual à parede pintada por um adulto, é uma maneira da criança reparar o erro e ver que o pai não estava 'só falando'.
Ocorre que muitas vezes os pais sucumbem ao cansaço e acabam 'deixando pará lá'. Dá trabalho sustentar a própria palavra, mas não há outro meio para transmitir a ideia de que ' o dito é pará valer'.

Marcia Arantes e Helena grinover
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terça-feira, 9 de agosto de 2011

Agenda cheia




















Dora, garota de nove anos, deixa uma mensagem no celular de sua mãe, que está no trabalho: "mãe, liga pra cá, eu não tenho nada pra fazer...beijo". 
A mãe relata que nessa manhã a filha teria aula de ballet, mas na semana anterior haviam desistido de continuar com as aulas porque a garota reclamava há meses dizendo que estava "chato". 
Não sabemos ao que a menina se referia quando expressava essa reclamação em relação à dança, mas sabemos que, quando se deparou com a ausência de uma atividade programada, sentiu-se perdida, sem conseguir definir o que tinha vontade de fazer. Ela sabia o que não queria, mas não conseguia saber o que queria.
As crianças, quando os recursos financeiros dos pais permitem, estão com as agendas cheias: música, esportes, língua estrangeira, reforço escolar... às vezes numa quantidade tão excessiva, que gera desatenção, falta de interesse, mau desempenho. Mesmo nos recreios das escolas, festas, hotéis, clubes, essas crianças têm atualmente um grande período com monitores, onde as brincadeiras são vigiadas e conduzidas. Essas atividades, apesar de por vezes serem atraentes, não propiciam algo importante. 
É um enorme aprendizado administrar o próprio tempo, decidir o que fazer, tomar as iniciativas. Quando ela 'não tem nada para fazer', ou melhor, quando nenhum adulto está propondo nada, pode ser o grande momento de inventar, descobrir, criar cenários imaginários, andar no próprio ritmo, encontrar o jeito pessoal. São vivências que a preparam para desempenhar melhor as tarefas dirigidas que terá que enfrentar.
Como seria bom se, diante desse recado no celular, a mamãe da Dora não se apressasse em propor coisas, como é, geralmente, a tendência dos pais.

Helena Grinover e Marcia Arantes

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Mesmos pais, filhos tão diferentes 2




















Tati e Lucia são duas irmãs, de 5 e 8 anos. Uma é muito falante, perguntadeira, curiosa. A outra é concentrada, gosta de se dedicar ao que está fazendo, atenta.
Pais, parentes e até professores costumam fazer comentários sobre irmãos, às vezes comparativos e competitivos. Comentam sobre as características físicas, o cabelo que é igual ao do pai, o nariz que é igual ao da mãe, ou como se parecem entre si. É interessante perceber como as falas em geral apontam para o fato de que são irmãos, mas também de que não se parecem: a Tati é mais falante do que a Lúcia. A Lúcia presta muito mais atenção do que a Tati...
Por terem os mesmos pais ou por se criarem juntos, há uma expectativa de que os irmãos sejam parecidos, revelando traços de sua origem comum, biológica ou familiar. Mas o fato é que, a despeito de aparentes semelhanças, são diferentes e é nesse palco que muitos dramas e comédias familiares se desenvolvem. 
As crianças, por seu lado, se sentem protegidas e emocionalmente amparadas quando se vêem 'iguais'. É comum o irmão mais novo procurar ser como o mais velho, imitar, querer o que o outro tem, fazer um grande esforço para acompanhá-lo. Entretanto, a tarefa de se diferenciar é fundamental e desejada por todos. Caso não seja cumprida, a pessoa arrisca-se a passar a vida em uma posição de sombra do irmão ou da irmã. Por vezes, não sabem mais quem é sombra de quem, tal a interdependência no par fraterno que se consolida. 
Os adultos podem ajudar as crianças nessa jornada de ir se diferenciando e, ao mesmo tempo, se integrando na família. É importante mostrar a elas que as diferenças não existem apenas em relação aos irmãos, como é dito no exemplo, e que, principalmente, não representam uma vantagem ou desvantagem competitiva para toda a vida. Ser mais falante, ou ser mais concentrado será ou não uma boa característica, dependendo de seu uso em cada situação. Tati não é somente diferente de Lúcia e viceversa, mas é diferente de todos os seres humanos, sendo única em sua maneira de ser.
Ensinar a ver o diferente dentro da igualdade, sem juízos de valor, é um dos desafios da nossa atual aldeia global.


Marcia e Helena Grinover




























terça-feira, 26 de julho de 2011

Das tripas coração



Ouvi, há alguns dias, trecho da entrevista de uma atriz que, exaltada, clamava para que os pais recuperem sua autoridade na família e cobrem o respeito dos filhos, atribuindo a isso parte da violência social constatada atualmente.
Lembro-me de um pai, extremamente preocupado que, apesar de todas as tentativas, não estava conseguindo limitar o uso da Internet pelo filho de 16 anos. Quando eu lhe disse: 'já pensou em tirar o computador?'. Ele me olhou espantado e respondeu: 'mas não é muito violento??'.
Colocar limites, ensinar que o esforço é muitas vezes condição de resultado, que nem sempre fazemos só o que gostamos, que todos devem aceitar regras para viver em sociedade, exige que os pais se coloquem na contramão de uma maré poderosa. A maré reinante atual nos invade com as idéias de que tudo pode ser conseguido sem grande esforço, que basta querer para poder e etc...Tanto é assim, que os pais têm muitas vezes a impressão de que estão sendo violentos ao se opor energicamente aos desejos dos filhos. 
Em vários momentos há de se fazer 'das tripas coração' para levar os filhos a se submeterem ao que a sociabilização exige. Os pais têm o desejo visceral de poupá-los de todo sofrimento.Por outro lado quando eles não correspondem às suas expectativas, sucumbem a uma raiva surda, também visceral, que impulsiona a querer obrigá-los ditatorialmente a obedecer suas ordens. É preciso sair das vísceras para não cair na permissividade omissa, ou no autoritarismo.
A autoridade é diferente do autoritarismo porque quem a exerce está praticando valores, ideais, que considera e estima como bons para todos, inclusive para sí próprio. Daí surgem os melhores critérios, e não das emoções viscerais, para nortear o que comer, o que ler, com quem se relacionar, o que vestir, e tantas escolhas vida afora... 
Se o pai estiver pautado por esses valores e principalmente, se ele próprio se submete a eles, quando tirar o computador do filho não estará sendo violento, ou melhor, talvez nem tivesse que chegar a tanto...

Marcia Arantes e Helena Grinover

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Pai amigo?




























Há alguns dias ouvimos uma educadora comentar, com curiosidade e certo espanto, um novo jeito, estimulado pelos próprios adultos, das crianças chamarem os seus pais usando os nomes próprios ao invés das palavras 'pai' ou 'mãe'. Seria uma maneira de aproximação, de criar intimidade? Ou seria uma forma de desocupar o lugar de progenitores?
Quando a criança se refere aos pais chamando-os de 'papai' ou 'mamãe', está conferindo a eles um lugar único. Isso terá um papel tanto para o filho, quanto para os pais assim chamados. Trata-se de criar um lugar a partir do qual as funções se desenvolvem. 'Mãe' não é o mesmo que Maria, Lucia, Beatriz...
Esse tema nos lembra outro: pais que fazem questão de dizer aos filhos que são seus amigos, colocando-se assim lado a lado, no mesmo plano que outros amigos. O lugar dos adultos que são responsáveis pela educação, no sentido de preparo do futuro cidadão, define funções diferentes das de uma amizade, embora os pais e professores devam ser amigáveis e ficar amorosamente ao lado das crianças e jovens sempre que puderem.
Amigos são aqueles com os quais nós estabelecemos relações que incluem conversar, compartilhar, confiar,
discutir, rir e, inclusive, desafiar e enfrentar os mais velhos. 
É importante que crianças e adolescentes possam questionar as autoridades dentro de casa e na escola. Isto os prepara para a separação que todos desejam que se realize com sucesso para que um dia ocupem o lugar de adultos! 
As ações e reações advindas desses embates vão depender das condições de cada família, de cada escola e aí cada caso é um caso...
O que é certo é que os pais e filhos, alunos e professores, terão de ficar em lados opostos para que esses saudáveis conflitos possam ocorrer e cabe aos adultos manter firmemente as posições em que acreditam para que os mais jovens tenham oportunidade de contestá-las. São as tão necessárias referências!
Ora, sendo assim, amigos, amigos... pais e professores à parte.

Marcia Arantes e Helena Grinover
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domingo, 10 de julho de 2011

Não dá para dizer não?




















Esta semana fomos chocados pela entrevista de uma mãe londrina conhecida como 'barbie humana' devido a quantidade de cirurgias plásticas que fez, declarando ter dado à filha de 6 anos, um 'voucher-silicone' para realizar um implante nos seios aos 16. Essa mãe declara que a filha implorou pelo presente. Claro, estamos diante de uma exceção, mas bastante útil para refletirmos a respeito de onde nos leva a impossibilidade de dizer 'não'.
O 'não' tem efeito de uma barreira tanto para quem diz, quando para quem escuta. Quando não podemos colocar essa barreira, funcionamos como uma espécie de canal por onde tudo passa: não há limites para a entrada, e nem para a saída. Transformamo-nos num corpo boiando num mar de demandas. No exemplo que citamos, o efeito sobre a filha só o futuro dirá, mas podemos imaginar que será um novo corpo a boiar no reino do vale-tudo, ou terá que fazer um enorme esforço para encontrar algumas âncoras.
A menina declara que está muito feliz com o presente porque terá "peitos lindos como os da mamãe". Por enquanto, o corpo e o sonho de beleza dessa menininha são moldados pelos desejos da mãe. Esta, por estar aprisionada à ilusão de um corpo cada vez mais perfeito, fica impossibilitada de recusar o pedido da filha. No fundo, o que ela não pode é dizer 'não' para si mesma e usa a criança para continuar as suas intervenções plásticas.
O educador deve ser capaz de barrar suas próprias expectativas, reconhecer nesse outro ser necessidades diferentes das suas, para oferecer perspectivas e valores mais amplos, inseridos numa cultura que está acima dos desejos individuais.

Marcia Arantes e Helena Grinover
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segunda-feira, 4 de julho de 2011

O que os olhos não vêem...



















Uma garota de sete anos de idade, acompanhada da avó, assiste no computador um a clip musical. A música fala de amor, saudades e é cantada por uma adolescente, vestida de mini saia, rebolante, fazendo caras e bocas. A avó observa "esse clip é para adolescentes, não?". "É só uma música, vovó", responde a garota.
Na cena final a cantora beija na boca um jovem e a menina rapidamente tampa com as mãos os próprios olhos."Porque você fez isso?", pergunta a avó. "Por causa do que você disse", responde.
Ela evita a visão do beijo. Sabemos que nos seres humanos a visão da imagem dos outros é responsável pela constituição dos desejos. O desejo humano nasce de uma identificação com os os outros, dito de outra maneira, nasce quando um se vê no lugar do outro e passa a desejar o que esse outro possui. A garota sabe que se espera que ela não queira ainda ser uma adolescente, então na hora do beijo procura se separar, se isola da cantora que admirava e com quem se identificava até esse momento. Enquanto era só uma música...
O ato da garota mostra a força da imagem. O que a publicidade visual faz é utilizar essa força para criar desejos nos espectadores. O que a garota revela é que esse objetivo é plenamente atingido, ela se protege da visão.
Sabemos o quanto é difícil para os pais acompanhar e selecionar o que as crianças vêem nas telas, uma explosão de imagens e relativamente poucas palavras. No entanto, é sua função e dos educadores em geral,' não fechar os olhos', mas posicionar-se como barreira protetora, opinando e transmitindo seus valores.
As colocações dos adultos são referências importantes diante da tarefa de digerir a invasão da mídia, que nem sempre se questiona sobre os efeitos sociais de suas mensagens.

Helena Grinover e Marcia Arantes
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terça-feira, 28 de junho de 2011

Vítimas da publicidade


A menininha coloca na cabeça a coroa da princesa, a peruca com longas tranças e pronto: virou princesa. O menininho veste a roupa do homem aranha e se torna super herói. Uma insígnia, um emblema, tem o poder de transformar suas identidades. Olham-se no espelho e sua imagem reunida a esses elementos dá a ilusão de que adquiriram capacidades, força, transformaram-se .
Um dos objetivos da publicidade é criar essa ilusão de que ter é igual a ser e nas crianças, especialmente, o efeito é certeiro - elas ficam aprisionadas pela imagem e passam a desejar o produto imediatamente, sem crítica.
O adulto também cai no engôdo de acreditar que ao possuir determinados objetos torna-se outra pessoa. Entretanto, em crianças o efeito é mais preocupante. Quando ficam coladas à necessidade de posse de determinados produtos, diminuem a capacidade de usar o "faz de conta" para se transformar, empobrecem a construção da imagem pessoal e de suas potencialidades. Além disso, podem passar a acreditar que para serem valorizadas, amadas, admiradas, devem ser iguais a "maravilhosa"criança da publicidade e para tal, devem possuir os mesmos brinquedos que ela.
Numa sociedade que estimula ao extremo a posse de bens, que invade diariamente os cidadãos com mensagens enganosas e atraentes, torna-se mais penosa a tarefa de discriminar entre o que temos e o que somos.
É função primordial da educação, portanto dos pais, ajudar esses seres em formação a prosseguir nessa discriminação: brincar de mamãe e filhinha independe de possuir a boneca 'x'. 
Os pais perceberão que sua excelência não está vinculada a fornecer produtos aos filhos!

Marcia Arantes e Helena Grinover
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segunda-feira, 20 de junho de 2011

Consumimos crianças?



















O artigo de Ruy Castro na Folha de São Paulo, dia 17/06/2011, 'Guerra ao Gugu-dadá', aborda a questão das crianças que são levadas a encarar, cada vez mais cedo, o aprendizado de idiomas, o uso da internet, os regimes alimentares, o consumo de produtos para adultos, etc.
Podemos acrescentar a essa lista as festas infantis com shows e temas de adolescentes, aniversários em spas com tratamentos de beleza para meninas de nove, dez anos, e outras precocidades que chegam a ser constrangedoras para quem observa. Vocês ja tiveram a oportunidade de ver crianças dançando funk, como foi mostrado no programa 'A Liga' (TV Bandeirantes) há algumas semanas? Fico imaginando o que pensarão essas crianças sobre seus pais, que foram coniventes, ao virem o vídeo dessas festas daqui a alguns anos, quando puderem entender o significado das coreografias...
Os filhos são herdeiros dos desejos dos pais, é importante e inevitável que seja assim. 'Meu filho terá o que me faltou, o que eu não tenho, será meu seguidor, terá o melhor que eu puder dar...' Não é fácil por limites nisso tudo.
Mas é possível fazer a separação entre o que são os desejos dos pais de popularidade, de sucesso profissional, de beleza e o que são as necessidades das suas crianças. Às vezes, os adultos submetem as crianças a um stress desnecessário e com sérias consequências, por causa da insatisfação com as próprias vidas.
Será mais fácil enfrentar a imensa pressão do marketing e da sociedade, se tiverem a convicção de que sua função é proteger os filhos da violenta submissão a situações que eles não têm, ainda, capacidade para compreender.

Sugerimos aos nossos leitores as postagens: Brinquedos que consomem, de 06/06 e Infância Violentada? de 16/05.

Marcia Arantes e Helena Grinover
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segunda-feira, 6 de junho de 2011

Estranhamento


















O bebê que era tão amigável, simpático, sorria para todos, um belo dia começa a 'estranhar'. Já não aceita o colo de qualquer um. A criança, que era tão segura de si, por volta dos dois ou três anos, passa a ter medo de pedintes, de palhaço, do médico, de papai noel...
Naturalmente, os pais se preocupam e buscam as causas. Será que alguém a assustou ou ela viu algo relacionado a essas figuras? Entretanto, pode não ter acontecido nada especialmente assustador na realidade.
Os medos surgem como consequência do crescimento, com mudanças no psiquismo que transformam as vivências. Uma delas é que criança passa a perceber melhor a diferença entre ela e os outros, 'os estranhos'. Assim, o que antes não a assustava agora é visto com "outros olhos" e passa a ser temível!
Por vezes, o medo escorrega para fatos banais no dia a dia. Uma pessoa com a cor da pele diferente de seus familiares, um traço que se sobressai muito, tal como um tipo de cabelo, uma característica física evidente, podem causar horror. A criança também pode passar a ficar constrangida em situações sociais e inesperadamente reagir rejeitando as pessoas.
Para continuar crescendo ela precisará ter experiências que ampliem suas noções do que é 'familiar' incluindo pouco a pouco mais diferenças.
Bom seria se isso se desse sem exposições forçadas e penosas às figuras amedrontadoras, sem exigir que ela logo entenda, pela explicação lógica, que "não faz sentido ter medo de um amistoso papai noel...." As explicações lógicas têm pouquíssima eficácia na diminuição dos medos.
O adulto pode ajudar afastando momentaneamente a criança da situação que a estressa, e posteriormente acompanhando e facilitando a descoberta de pontos de igualdade dentro das diferenças.

Marcia Arantes e Helena Grinover
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segunda-feira, 23 de maio de 2011

A lição de casa


















A mãe chega em casa após o trabalho, cansada, esbaforida e pergunta: ‘filho, já fez a lição?’. Se a resposta for negativa, inicia-se a celeuma: 'se não fez, não pode ficar no computador, já combinamos, é sempre assim, porque você não obedece, etc, etc...' Rapidamente a situação fica tensa, regada a lamúrias e ameaças.
Outra situação: a mãe tem como trabalho as atividades domésticas, entre elas, supervisionar a lição dos filhos. Nesses casos pode acontecer que o ‘supervisionar’ escorregue sutilmente para tomar para si as tarefas escolares, a ponto de completar partes de próprio punho, fazer pesquisas na internet e por aí afora.
Em princípio, a lição de casa deve ser o momento valioso de firmar conhecimento, de ousar hipóteses, ou de se deparar com dúvidas. Para isso é fundamental que a criança esteja numa saudável solidão, para se concentrar sem a demanda ativa do adulto, que deve oferecer suporte apenas quando necessário.
Também é importante que ela possa arcar com o que ocorrerá na escola se não tiver feito a lição. Isso possibilita que ‘tome posse’ do conhecimento, assuma a escola como parte de sua vida e se responsabilize por ela. Por aí poderá encontrar o prazer envolvido no aprender, no exercício da curiosidade, no desafio. Caso contrário, a escola fica sendo uma parte da vida em que ela tem que realizar o que interessa aos pais, sentindo-se submetida a algo contra o qual poderá se rebelar.
Muitas vezes a lição se converte em moeda de troca, o conhecimento se torna obrigação e os pais transmitem, inadvertidamente, a mensagem de que estudar é chato, bom é videogame...

Marcia Arantes e Helena grinover
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http://vivazpsicologia.blogspot.com.br/p/servicos_22.html




segunda-feira, 16 de maio de 2011

Brinquedos que consomem

As crianças, ao brincar,  criam uma série de estórias, vão imaginando e transformando mentalmente seus brinquedos, que adquirem uma vida construída por elas. Podemos ver isso nas falas que acompanham as brincadeiras e que os pequenos em geral não gostam que os adultos ouçam, pois revelam suas intimidades.
Os brinquedos atualmente já vem cheios de desempenhos: bonecas que choram lágrimas, falam, cantam, fazem xixi. Os carros, os aviões, são tão performáticos quanto os verdadeiros. As crianças têm que descobrir uma brecha onde o brinquedo lhes permita inventar algo próprio, ao invés de só apertar botões.
O mais triste dessa história é que em muitas famílias o dinheiro necessário para outras coisas é gasto nesses apetrechos dispendiosos e pouco importantes para o prazer e a função de brincar. Já ouvi uma mãe dizer: "lá em casa falta dinheiro, mas brinquedo não falta não..."
O importante é que brincar não é igual a ter brinquedos, basta ver o que os pequenos fazem com objetos como pregadores de roupa, tampas de panela, retalhos de pano e uma infinidade de coisas. É com isso e com brinquedos mais simples que a função do brincar melhor se realiza. Muitas vezes os automatizados apenas ficam na estante.
Com brinquedos tão próximos da realidade, corremos o risco de inverter a posição do agente na brincadeira. Outro dia, numa brinquedoteca, ouvi uma menina perguntando à mãe: ' o que essa boneca faz ?' Seria bom perguntar à garota o que ela gostaria de fazer com a boneca...


Helena Grinover e Marcia Arantes
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Birras 2


















Estou caminhando por um clube bastante tradicional da cidade de São Paulo, quando vejo um garoto de aproximadamente quatro anos chorando muito e urrando "mãe vem aqui !". A jovem mãe caminhava e se afastava lentamente, aparentando calma e tranquilidade, sem olhar para trás. A cena foi tão impactante que várias pessoas ficaram paradas, sem intervir, mas também sem deixar de olhar, tal era o desespero do pequeno! Finalmente uma menina de seus oito ou nove anos aproximou -se do garoto, ajoelhou-se junto a ele, que a esta altura já estava de joelhos e rouco de tanto gritar, e o acompanhou até sua mãe. Parabéns a ela!
Já ouvi mães dizerem: "se faz birra, finjo que não vejo". 
O adulto entende a birra como uma tentativa de controle da criança sobre ele e "faz de conta" que não está sendo submetido. Na verdade está sim submetido a uma cena, que expõe a ele e a seu filho de forma constrangedora.
Educar a criança é ajudá-la a suportar a frustração de não ter tudo o que quer. A mãe desse garoto deixou- o abandonado ao desespero de não saber mais o que fazer, apenas conseguia gritar até ficar sem voz. Perdeu a oportunidade de ensiná-lo a se acalmar e encontrar uma alternativa para o que quer que fosse que o tenha descontrolado tanto.


Helena Grinover e Marcia Arantes
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