Observo a cena de longe, sem ouvir as palavras: em uma mesa estão sentados quatro adultos e na cabeceira uma menininha de seus 15 meses. A criança tenta com um garfo pegar algo do prato de seu pai. Ele afasta o prato, tira dela o talher e lhe oferece com as próprias mãos uma colherada; ela vira o rosto. Agora a garota se estica por cima da mesa, pega outro garfo e tenta comer do prato de sua mãe. Novamente não deixam. Já quase deitada sobre a mesa a menininha abocanha um alimento com a mão. Outra vez afastam os pratos e um adulto procura lhe dar comida diretamente na boca. Inútil, ela não quer. Numa pequena distração dos grandes, pega outro garfo, consegue espetar a comida e põe na boca. No mesmo instante a mãe exclama: 'Olha! Não sabia que já conseguia comer com o garfo'.
A garota estava muito interessada em usar o garfo para comer, revelando uma capacidade de independência desconhecida por seus pais.
Os adultos fazem verdadeiros malabarismos para conseguir que os pequenos comam, o que pode despertar neles maior interesse pelas brincadeiras do que pela atividade de se alimentar. Quando o ato de comer ocorre sempre junto com o de brincar, assistir televisão e outras artimanhas, criam-se verdadeiras dependências. Frases do tipo: "ele só come se..." ilustram bem isso. Portanto, nada de brinquedos, livros, musiquinhas que distraiam e façam com que a criança não perceba que está ingerindo. Sentir o alimento na boca, a mastigação, a deglutição, faz com que o ato seja prazeroso em si mesmo. Os recursos adicionais enganam, trazem mais dificuldades do que alívio.
Deixar que os pequenos comecem a comer sozinhos não é nada fácil. Há o receio de que não comam o suficiente, o trabalho de limpar roupas e objetos , o processo é mais lento... Entretanto, desta maneira eles podem constituir o desejo de se alimentar e responsabilizar-se por ele. Podem seguir o próprio ritmo, estabelecer a quantidade, desenvolver um interesse pela atividade motora de apanhar o alimento e levá-lo à boca.
É muito importante apostar na capacidade da criança de gostar do ato de comer. Se, por vezes, ela não se alimenta na quantidade esperada, que isso possa ser aceito como uma alteração que faz parte do processo. As quantidades variam em função da idade e do momento, sem causar abalo na nutrição. O acompanhamento do pediatra ajuda os adultos a terem uma referência para indicar se o desenvolvimento da criança está adequado.
Que tal dar adeus ao famoso aviãozinho ?
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