terça-feira, 6 de novembro de 2012

Medo necessário




















Henrique tem quatro anos e meio e sua irmãzinha seis meses. Houve um período, após o nascimento da menina, em que o garoto ficou inquieto, mais chorão e sem paciência. Passou também a reter a urina, ficava bastante tempo sem ir ao banheiro, acabava molhando as calças e aí se mostrava muito angustiado. Certo dia, diante de uma lanchonete, aproximou-se dele um homem vestido de dragão, com uma fantasia enorme. O garoto ficou apavorado e daí em diante passou a ter medo destas grandes figuras que se movimentam por meio de um ser humano no seu interior. A mãe observa, entretanto, que depois disso ele recuperou certa calma, voltou a ir ao banheiro normalmente...
O nascimento de irmãos, especialmente na faixa etária de nosso protagonista, propicia uma série de dúvidas e temores que surgem quando a criança realiza que o nenê saiu de dentro do corpo da mãe. As questões giram em torno das diferenças sexuais entre homens e mulheres, das separações, evocam os mistérios da vida e, consequentemente, da morte. Os pequenos se perguntam sobre os desejos da mamãe e o papel do papai na família. Portanto, pode-se esperar que apareçam essas angustias vagas que causam mudanças visíveis e incompreensíveis, aquelas que os adultos costumam dizer que são por ciúmes do irmãozinho, pois claramente estão ligadas à chegada dele. 
Henrique não conseguia expressar com pensamentos e palavras sua ansiedade que se traduzia em perturbações generalizadas e na retenção da urina. Quando passou a ter medo dos dragões e personagens afins, concentrou os sentimentos ameaçadores nestas figuras. Agora, bastava evitar esses monstros! 
Podemos levantar a hipótese de que os medos `curaram´ a angustia difusa que o molestava. 
Lembremos que há seculos as histórias introduzem figuras assustadoras na imaginação das crianças. Elas têm a função de cercar as  inevitáveis ansiedades infantis. Mantendo-as presas a esses personagens fantásticos, ajudam os pequenos a terem um bem estar emocional. 
Os pais, preocupados em diminuir o sofrimento dos filhos ou torná-los corajosos, buscam convencê-los de que não estão correndo perigo, `essas criaturas não existem´ ou `bonecos não fazem nada´. Mas convém dar a eles um tempo, deixar que encontrem soluções próprias para seus temores.  Podem ser medos necessários...

Helena Grinover e Marcia Arantes












3 comentários:

  1. Oi Helena, adorei. Gostaria de saber mais sobre o despertar do medo na infância se possível. Obrigada,
    Raquel

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    1. Olá Raquel, é muito bem vindo seu comentário. Você gostaria de formular mais questões sobre o medo na infância para estimular novos posts aqui no blog? Obrigada.
      helena

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  2. Noto que algumas das crianças de 2 anos já sentem medo enquanto outras não. Minha filha mesma com 2 anos sabe o que é medo, pois ela vê em estórias fatores que dão medo e observa os personagens e suas feições e de alguma forma ela comenta o assunto, o que acho ótimo. Fico imaginando o que provoca o despertar do medo, pois quando são bem pequeninos parecem não ter; se é angústia da criança transferida, com você sugeriu ou se é trazido por fatores externos, tipo Tv ou cenas reais que podem ser mesmo apavorantes. Obrigada.

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